quarta-feira, 28 de março de 2012

Resenha Crítica


Crítica: Diário de uma paixão

Diário de uma paixão

Marcelo Hessel
05 de Agosto de 2004

Diário de uma paixão
  The Notebook

Inglaterra/EUA, 2004
Romance - 121 min.
Direção: Nick Cassavetes
Roteiro: Nick Cassavetes, Jeremy Leven
Elenco: James Garner, Gena Rowlands, Joan Allen, Ryan Gosling, Rachel McAdams, James Marsden, Sam Shepard, David Thornton
Noah, o carpinteiro humilde, e Allie, a loirinha rica, tiveram um namorico de verão. Tudo acabou quando a mãe de Allie disse que Noah não era do nível da família. Anos depois da briga, o menino pobre amadurece e a menina afortunada aguarda o dia do seu casamento com um filho da alta sociedade. Nunca mais se veriam se o destino não os reunisse no mesmo cenário que um dia os assistiuamando...
A trama pode parecer ultrapassada, mas Diário de uma paixão (The Notebook, 2004) não tem medo de optar pelo mais trivial água-com-açúcar. Pelo contrário. Por trás de uma aparentemente simplória história de amor, há a defesa metalinguística de um gênero que caiu em desuso nos atuais dias de cinismo. Até a época retratada pelo diretor Nick Cassavetes, os anos 1940 da guerra e do sonho americano, remete aos tempos áureos do melodrama.
Noah e Allie, vividos em 1946 por Ryan Gosling Rachel McAdams, são interpretados cinquenta anos depois por James Garner Gena Rowlands, mãe do diretor. Ela está internada numa casa de repouso, com Mal de Alzheimer. Ele a acompanha com o caderno do título, do qual tira diariamente a mesma história dos dois jovens apaixonados, Noah e Allie. O velho se esforça, assim, para manter na memória doente dela a lembrança do amor.
Não há problema em revelar aqui a verdade dos personagens - situação um tanto evidente, que o roteiro tenta manter em ineficaz suspense. O que importa, sim, é entender que a luta de Noah em preservar o passado diz menos respeito a Allie e muito mais ao próprio gênero engolido pela História. Saber que o filme se destina a simplesmente homenagear o melodrama torna tudo mais prazeroso. O incômodo da trama rasa dá lugar à nostalgia da roda gigante, dos amassos no cinema, dos passeios de barco e dos amores incondicionais.
Isso basta para induzir, com eficácia, o choro da audiência. Mas há o outro lado. E se o filme não tem medo de ousar, que aceite a crítica da sua pretensão. Essa museologia ingênua, tipo "como era bom naqueles tempos...", anda de mãos dadas com o fetiche e a paródia. É como a banda Darkness que vampiriza o Heavy Metal farofa ou os grupos do "Novo Rock" que se vestem como os seus pais hippies: tudo não passa de risível e anacrônico fetichismo. Sem reinventar antigas fórmulas, sem introduzir algo novo, não há como fazê-las funcionar com autenticidade.
E se você cair na gargalhada diante do bigodudo pai de Allie, da revoada digitalizada de pássaros, dos negros dançando em volta da fogueira sulista, ou do Noah perplexo com a guerra, não se sinta um herético insensível. A culpa não é sua.
Havia meios de fazer com que Diário de uma paixão fosse um filme melhor. Se Cassavetes tivesse interrompido a narrativa no momento em que a velha Allie perde a memória e surta, seria o final perfeito: instigante, anticlimático, consciente da sua falibilidade, dos limites da sua viagem revivalista. Mas o diretor se deixou enganar pelo sentimentalismo, justamente quando estava bem no olho do furacão temporal.


Originalmente publicado no site: www.omelete.uol.com.br

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